Ivan Drummond - Estado de Minas
Os Jogos Olímpicos de Londres terminaram há 20 dias. A Paralimpíada
se encerrou domingo. E a próxima edição desses eventos será no Brasil,
no Rio, em 2016. No entanto, não existe no país uma política específica
para o desenvolvimento do esporte. Além do mais, quais atletas estão
sendo preparados para competir na Olimpíada brasileira? Sabe-se que
haverá uma cobrança por medalhas. O Brasil, que conquistou 17 em
Londres, terá no mínimo que dobrar esse número para não ser considerada
uma participação vexamosa. E todos sabem que para ser almejar o futuro é
preciso, acima de tudo, investir na base. Isso ocorre hoje? A reposta é
um sonoro não. No judô mineiro, por exemplo, para competir, pais, mães,
jovens atletas, promessas do esporte fazem sacrifícios inimagináveis
devido à falta de apoio e ao descaso, principalmente das autoridades,
que não ajudam em nada. De tempos em tempos há o surgimento de um
fenômeno. Mas quando isso ocorre, é fruto do sacrifício e do esforço
pessoal desses atletas.
Dia de emoções múltiplas
Madrugada de sábado, 1º de setembro, 2h. Rua Itaité, no Bairro São Geraldo, porta da Academia de Judô São Geraldo. Dois ônibus estão à espera de um grupo de crianças, adolescentes e alguns pais, que vão até Ipatinga, sede do Dangai de Judô 2012 e do Mineiro de Judô Sênior. Na equipe, 52 competidores, sendo que 33 são parte de um projeto social com a Escola Municipal Padre Francisco Carvalho Moreira, também do bairro. Não há luxo, nem fartura. A viagem só se tornou possível graças ao esforço da escola para alugar os dois ônibus. O objetivo: viajar, lutar e voltar.
O ônibus parte. Meia hora depois, todos estão dormindo. Mais tarde, uma parada, em João Monlevade, para um lanche e esticar as pernas. Nada de sucos, isotônicos ou salgados. Os meninos recebem um pão com mortadela, preparado pelo professor Geraldo Brandão de Oliveira, o técnico do Judô São Geraldo, com barras de cereais, que a meninada adora, e guaraná.
Logo, os ônibus seguem seu caminho. É preciso estar em Ipatinga às 6h30, que é quando começa a pesagem dos atletas. Isso será feito em apenas uma hora. Às 8h começa a competição. E na chegada à Usipa, onde acontecerá o torneio, primeiro a balança. Depois, um modesto café da manhã: um copo de plástico com café com leite e um pão com manteiga.
É hora de ir pra luta, literalmente. O professor Brandão, um abnegado – foi um dos que ajudaram a sanear o judô mineiro, há bem pouco tempo, quando foram constatadas irregularidades na gestão de Antônio Costa na Federação Mineira (foi impugnado e proibido de voltar às atividades esportivas) –, se mostra ansioso. É uma experiência nova, pois a maioria dos meninos não tem mais de seis meses de experiência.
“Eles é pediram para vir ao Dangai. Na reunião, quando disse que talvez não fosse possível, teve menino que chorou. Por fim, encontramos a solução e todos puderam participar”, conta.
E para cada um dos que vão para a competição, um momento especial, diferente de tudo o que já haviam experimentado. Matheus Júnior de Oliveira, de 13 anos, se preparou para o torneio. Deixou para cortar o cabelo horas antes do embarque e fez um corte moicano. “Um amigo, meu vizinho, foi quem fez pra mim.” Mas ele surpreende ao contar de sua ansiedade. “Não durmo há duas noites, pois só fico pensando como será estar no tatame lutando. Deve ser diferente do treino.”
A seu lado está Guilherme Santos, de 14 anos, que é da academia e está na quarta competição. “Estou lutando há seis anos e o melhor momento é quando a gente vai para a disputa. É algo que fascina.”
Ansiedade Não são só os meninos. As meninas mostram a mesma vontade. Aline Martins está na arquibancada. Assiste de longe às primeiras lutas e não para de perguntar ao professor Brandão, a quem chama carinhosamente de “sensei” (uma designação de respeito no Japão, onde nasceu o esporte, que significa “pessoa mais velha”). “A que horas será a minha luta, sensei?”
As lutas se sucedem. A previsão, ou melhor, o sonho do professor Brandão, era ganhar uma medalha. Para ele, “já estaria de bom tamanho, uma recompensa pelo que estamos fazendo nesse pouco tempo.”
Muitos dos meninos foram para o projeto por ouvir dizer, como Ana Beatriz Santos Rodrigues, de 13 anos. “Comentaram na escola e resolvi experimentar. Falei em casa, com meus pais e com a direção da escola e eles me encaminharam. Estou muito feliz por estar aqui. Luto há apenas seis meses, mas acho que estou pronta. Quero ser campeã.”
Melhor do que a encomenda
Dia de emoções múltiplas
Madrugada de sábado, 1º de setembro, 2h. Rua Itaité, no Bairro São Geraldo, porta da Academia de Judô São Geraldo. Dois ônibus estão à espera de um grupo de crianças, adolescentes e alguns pais, que vão até Ipatinga, sede do Dangai de Judô 2012 e do Mineiro de Judô Sênior. Na equipe, 52 competidores, sendo que 33 são parte de um projeto social com a Escola Municipal Padre Francisco Carvalho Moreira, também do bairro. Não há luxo, nem fartura. A viagem só se tornou possível graças ao esforço da escola para alugar os dois ônibus. O objetivo: viajar, lutar e voltar.
O ônibus parte. Meia hora depois, todos estão dormindo. Mais tarde, uma parada, em João Monlevade, para um lanche e esticar as pernas. Nada de sucos, isotônicos ou salgados. Os meninos recebem um pão com mortadela, preparado pelo professor Geraldo Brandão de Oliveira, o técnico do Judô São Geraldo, com barras de cereais, que a meninada adora, e guaraná.
Logo, os ônibus seguem seu caminho. É preciso estar em Ipatinga às 6h30, que é quando começa a pesagem dos atletas. Isso será feito em apenas uma hora. Às 8h começa a competição. E na chegada à Usipa, onde acontecerá o torneio, primeiro a balança. Depois, um modesto café da manhã: um copo de plástico com café com leite e um pão com manteiga.
É hora de ir pra luta, literalmente. O professor Brandão, um abnegado – foi um dos que ajudaram a sanear o judô mineiro, há bem pouco tempo, quando foram constatadas irregularidades na gestão de Antônio Costa na Federação Mineira (foi impugnado e proibido de voltar às atividades esportivas) –, se mostra ansioso. É uma experiência nova, pois a maioria dos meninos não tem mais de seis meses de experiência.
“Eles é pediram para vir ao Dangai. Na reunião, quando disse que talvez não fosse possível, teve menino que chorou. Por fim, encontramos a solução e todos puderam participar”, conta.
E para cada um dos que vão para a competição, um momento especial, diferente de tudo o que já haviam experimentado. Matheus Júnior de Oliveira, de 13 anos, se preparou para o torneio. Deixou para cortar o cabelo horas antes do embarque e fez um corte moicano. “Um amigo, meu vizinho, foi quem fez pra mim.” Mas ele surpreende ao contar de sua ansiedade. “Não durmo há duas noites, pois só fico pensando como será estar no tatame lutando. Deve ser diferente do treino.”
A seu lado está Guilherme Santos, de 14 anos, que é da academia e está na quarta competição. “Estou lutando há seis anos e o melhor momento é quando a gente vai para a disputa. É algo que fascina.”
Ansiedade Não são só os meninos. As meninas mostram a mesma vontade. Aline Martins está na arquibancada. Assiste de longe às primeiras lutas e não para de perguntar ao professor Brandão, a quem chama carinhosamente de “sensei” (uma designação de respeito no Japão, onde nasceu o esporte, que significa “pessoa mais velha”). “A que horas será a minha luta, sensei?”
As lutas se sucedem. A previsão, ou melhor, o sonho do professor Brandão, era ganhar uma medalha. Para ele, “já estaria de bom tamanho, uma recompensa pelo que estamos fazendo nesse pouco tempo.”
Muitos dos meninos foram para o projeto por ouvir dizer, como Ana Beatriz Santos Rodrigues, de 13 anos. “Comentaram na escola e resolvi experimentar. Falei em casa, com meus pais e com a direção da escola e eles me encaminharam. Estou muito feliz por estar aqui. Luto há apenas seis meses, mas acho que estou pronta. Quero ser campeã.”
Melhor do que a encomenda
O dia vai passando, as lutas acontecendo, e com o cair da tarde, surgem os primeiros campeões. No Mineiro Sênior, a medalhista olímpica de bronze nos Jogos de Pequim’2008 Ketleyn Quadros rouba a cena. Vence a categoria leve, dando um show. É assediada por muitos meninos e meninas. Todos querem falar com ela. Vêm as finais do Dangai. Ana Beatriz Santos Rodrigues, de 14 anos, a menina que havia ouvido falar do convênio da sua escola, a Padre Francisco, com o Judô São Geraldo e pediu aos pais e à escola para entrar no projeto, tem o melhor dia de sua vida. Ela foi campeã da categoria leve, sub-15, faixa branca. Com apenas seis meses de judô. Já é vista como uma promessa. E não cabe em si. Chora e anuncia o que quer: “Quero ir à Olimpíada. É meu sonho.” Geraldo Rodrigues Silva, de 14 anos, já com o bronze no peito, incentiva os colegas. “Reage, Thago”, grita para Thiago Cruz, que passava dificuldades no tatame. E deu certo, pois o colega reagiu e venceu.
De Itaobim, uma das revelações da competição. Verônica Brazões Xavier, de 22 anos, é campeã da categoria ligeiro. “Tenho apenas seis meses de judô e, agora que ganhei aqui, quero muito mais. Quero ter a chance de chegar à Seleção Brasileira e disputar os Jogos Olímpicos. Gostei do judô, desde o início, pela filosofia, pelos fundamentos, pelos golpes. Essa foi minha primeira competição e espero, muito em breve, estar no Brasileiro.”
Da Escola Padre Francisco, além do ouro de Ana Beatriz, cinco pratas, com Amanda Matos, Geraldo Rodrigues da Silva, Matheus Júnior, Kethleen Lorraine Ferreira Cruz e Anselmo Geraldo Santos, e quatro bronzes, com Samuel Nascimento, Benjamin Martins Jr., Matheus Mendes e Alisson José Lopes.
É hora de ir embora. Almoço para todo mundo e pé na estrada. Os ônibus chegam ao São Geraldo às 23h daquele mesmo sábado. Todos estão contentes.
Sacrifício O Dangai e o Mineiro Sênior de Judô mostraram um raio X da base. O que é preciso fazer para que o esporte continue sobrevivendo? Herivelton Paulo Martins, da Associação Judô Mineiro, de Sete Lagoas, foi para Ipatinga com oito meninos. “Consegui a van emprestada na prefeitura, mas tive de pagar o combustível do meu bolso. É difícil, pois faço parte de um projeto social e não temos dinheiro sobrando. É mais para manter o trabalho. Vale o sacrifício de vê-los competindo pela primeira vez.”
Gilmar de Souza Franco comanda um projeto de extensão da Escola de Educação Física da UFMG, em Teófilo Otoni e Itaobim, Vale do Jequitinhonha. Foi para Ipatinga com sete meninos, que viajaram em uma caminhonete cabine dupla, a noite toda.
Franco, como é conhecido, é um apaixonado pelo judô, tanto que mesmo a base do projeto sendo Teófilo Otoni, duas vezes por semana vai até Itaobim dar aula a apenas dois alunos. “Vale a pena.”
Muito mais acontece nessa região do estado. Ele conta a história de um menino cujos pais são viaciados em drogas e um dos irmãos é traficante. “Ele me procurou pedindo para lutar e se eu podia deixar que ele dormisse na academia, pois não queria mais voltar para casa. Fui até a casa deles e conversei com os pais. Expliquei a situação e ele concordou em seguir em casa. É um dos melhores alunos que tenho.”
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